Parecer enviado à Agência Portuguesa do Ambiente em 05/03/2009
Relativamente ao EIA acima referido cabe-nos comentar o seguinte:
1 - É com contrariedade que a Sociedade Portuguesa de Espeleologia assiste à sistemática e completa ocupação das regiões cársicas portuguesas por parques eólicos, sem que se vislumbre um assomo de sobriedade que assegure que há uma visão de conjunto diferente da simples análise individual de cada projecto como se fosse indiferente para as entidades com a máxima responsabilidade sobre o ordenamento do país e da conservação da natureza a exaustão dos recursos naturais. Um correcto ordenamento a micro-escala, conseguido em geral à custa de grandes esforços dos funcionários de base envolvidos nos processos de avaliação e de enormes gastos por parte das empresas, não consegue esconder a falta de uma política de planeamento a nível superior nem a falta de coragem e/ou de competências dos políticos ou quadros superiores, que deveriam garantir previamente um planeamento adequado a macro-escala.
2 - Perante isto, a crítica de pormenor a um EIA de um projecto cujo principal impacto não é evitado, assemelha-se a um exercício de cinismo e hipocrisia, apenas mitigado pela satisfação do dever cumprido.
3 - Deste modo, salientamos que na região já todos os relevos calcários mais característicos, neste caso os bordos de planalto associados aos limites dos vales tifónicos, foram ocupados por parques eólicos, não restando praticamente nenhuma região deste tipo em "estado natural". Por isso, a crítica do pormenor e proposta de soluções não significa que a Sociedade Portuguesa de Espeleologia aprove a implantação deste parque eólico.
4 - Quanto à avaliação geral do EIA, consideramos que está em consonância com a evolução positiva que tem vindo a ser exigida a estes estudos e reforçamos as nossas anteriores recomendações quanto à prospecção, sondagem e acompanhamento especializado nas fases preparatórias e de construção para evitar a destruição de grutas eventualmente situadas nos locais de actuação e atravessamento.
5 - Consideramos que a caracterização geológica, geomorfológica e hidrogeológica é adequada mas chamamos a atenção para o facto de, na avaliação de impactes nos recursos hídricos subterrâneos (6.6.2, pág. 153 RT) não serem referidos impactos sobre a infiltração ocasionados pela destruição do epicarso nas zonas calcárias durante a fase de construção dos acessos, plataformas, sapatas, valas, etc.
6 - De novo, segundo a nossa opinião, assistimos a uma grande ginástica para esconder os impactes sobre a paisagem (e relevamos a não consideração da paisagem geomorfológica), aparecendo asserções do tipo "De uma maneira geral, considera-se que as perturbações esperadas ao nível das variáveis estruturantes do território sejam reduzidas, tendo em conta que irão respeitar medidas preventivas de localização e faseamento da obra assim como de integração paisagística. Esta atitude induz a minimização dos impactes negativos sobre as componentes físicas e ecológicas, no sentido de uma menor afectação e degradação da paisagem" (pág. 179 RT), não sendo claro no relatório quais as medidas que levarão a uma menor degradação da paisagem. Também, "Relativamente à linha eléctrica ..." (pág. 179 RT) não nos fica claro como é que adicionar uma nova linha a outras já existentes, "na envolvente próxima, torna estes impactes pouco significativos" (pág. 179 RT) e não cumulativos, ao invés, aliás, do que noutras partes do relatório se refere mas sem consequências. Tal como outros, de novo este EIA recorre ao nevoeiro para minimizar os impactes visuais, esquecendo, no entanto o efeito benéfico da noite, passe a blague. Os mesmos artifícios desculpabilizantes, que são tiques de muitos EIA's, se observam na justificação da pág. 184 RT: "a presença de dois parques eólicos em funcionamento na envolvente do PE Lourinhã I, tornam-nos menos críticos em termos visuais". Assim, subtraindo efeitos cumulativos, conclui "Após uma análise mais detalhada e sistemática, exposta neste estudo, considera-se que os impactes sentidos, apesar de negativos, são pouco significativos, de reduzida magnitude, localizados e reversíveis" (pág. 184 RT, sublinhados nossos), apesar de no capítulo sobre os impactes cumulativos referir, seca e inconclusivamente, a existência de impactes cumulativos.
7 - Consideramos que as partes relativas aos aspectos geológicos do Aditamento são suficientes e adequadas. Todavia, insiste-se que as grutas são fenómenos resultantes da carsificação, fundamentalmente geológicos, cujo principal valor é relacionado com a geologia, a geomorfologia, a sedimentologia, a paleontologia e a hidrogeologia, embora algumas tenham a ver com a arqueologia, daí que depreciemos a execução de uma "prospecção arqueo-espeleológica" que vem sendo hábito nos EIA's.
A Secção de Ambiente da Sociedade Portuguesa de Espeleologia